Quando o tudo e o nada deixam de ser meras noções abstratas.
Recordo-me de uma dessas noites de verão, quando no Brasil não são raras as enchentes e inundações, e eis que um repórter televisivo, fazendo o seu trabalho, interpela uma senhora, moradora de uma casa extremamente humilde, que estava a lamentar os estragos causados pela chuva: “Perdi tudo!” – foi o que ela disse. Mas como pode alguém que praticamente não tem nada, lamentar que perdeu tudo? Nessas horas não dá para trabalhar com as noções de tudo, nada, muito, pouco, mais, menos... e não se trata de relativismo, mas da força das vísceras a estraçalhar nosso platonismo, a transmutar valores e transversalizar linhas de pensamento. O Haiti ainda vai permanecer na linha de frente dos grandes e pequenos noticiários, mas até quando? Talvez pelo tempo que nos for possível suportar os efeitos deste acontecimento devastador de maneira meramente abstrata. Mas e depois? O destino dos grandes fatos noticiados é o mesmo dos pequenos: o esquecimento.