... por vezes pensar se dá por atravessamentos e atrevimentos. Entre corpos, nem dentro, tampouco só fora. Somos atravessados e atravessamos, nos atrevemos. Corpos podem ser de todo tipo, de toda natureza, matérias em decomposição-composição, moléculas em salto acrobático. Há ainda a insistência por se localizar no cérebro algum sinal do logradouro do pensamento. Não encontraram nada por lá (ainda). Vocês se lembram de Descartes e o episódio da glândula pineal? Anedotas a parte, não me importo mesmo acerca do que costuma ser denominado “o pensamento”, parecem tratá-lo muito mal, tal como se fosse algo estático, uma espécie de produto que pode ser embalado e vendido: “o pensamento de Kant”, “ o pensamento de Hegel”, e se não for distribuído através de uma editora de renome, divulgado por alguém com o devido pedigree não serve, não presta. Pensar para mim tem mais a ver com processo, em que riscos estão envolvidos, os mais diversos. É de um atrevimento imenso pensar nos dias de hoje, algo raro inclusive, que não ocorre simplesmente ao bel-prazer de uma contemplação, mas, mais por uma urgência que nos lança ao desafio descomunal, mergulho no desassossego, postura de inquietude e estranhamento, forças em tensão, à semelhança de um encontro com um tufão. Pensar, que seguindo as mais belas “fábulas” estóicas pode se dar mesmo quando pensamento não há. Não há pensamento já dado, aprioristicamente, quieto, parado, inofensivo. Pois se no beijar não há beijo, mas sim saliva, bocas, lábios, desejo, sapinho, bactérias, gengivas, dentes, mãos bobas... talvez o pensar se abstenha da necessidade de se parar mediante a cristalização de algo que sejamos capazes de denominar de maneira definitiva e absoluta “o pensamento”.
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